domingo, maio 07, 2006

Malungos e Vapores & outros poemas, livro de versos, assinala a estréia de Elder Oliveira na literatura. Como o poema que dá título ao livro indica, o escritor se apresenta como poeta-mensageiro, poeta-cavaleiro, poeta-violeiro, que determina sua atitude poética e conseqüentes constantes temáticas, daí advindas. A leitura dos poemas, portanto, vai plasmando a imagem de sua poesia que se caracteriza pela riqueza de conteúdo, carregada de metáforas de grande poder sugestivo, traduzindo a inquietação e a contestação social de um estado poético aberto ao mundo e ao momento histórico.

O sentido geral que estrutura o universo e a preocupação do poeta, enquanto artista da palavra, pode-se evidenciar claramente pelo verso de Prosa Brasileira que abre o livro: “Eu vim da dureza de tudo”.

Ser poesia-espelho de seu tempo torna-se a motivação básica desse canto que pretende interferir, perturbar, como “gosto acre”, mas, principalmente, insistir como necessidade: “Eu vim feito aço”. O poeta sabe de que é feito e porque faz. Partindo daí é que se compreendem os versos contidos em Malungos e Vapores.

Seria pretensioso tentar, num prefácio, analisar essa voz lírica em profundidade, concorrendo com a expectativa do leitor cuja sensibilidade, certamente, será estimulada pela força significativa da linguagem.

Não é difícil, no entanto, perceber que há uma recorrência de certos temas que vão se desenvolvendo gradativamente, à medida que a leitura vai evoluindo: a preocupação com o tempo, o discurso eminentemente lírico em que se manifestam a presença de Eros e a intenção metalingüística.

Nota-se que a passagem do tempo é percebida pelo poeta em vários níveis, que são evidentes na expressividade dos poemas. Às vezes, refere-se ao tempo que marcou uma fase da vida que o obriga a resgatar lembranças de “tempos perdidos”, como os amores do passado, a infância e outras experiências vividas, como são reveladas no poema Manifesto de Fundo do Tempo e da Magia. É o tempo mágico que não se pode recuperar. Outras vezes, fala do tempo defeituoso que contamina os seres “Na fúria desses ventos traiçoeiros” (Anotações Verticais), tempo corrosivo, que carrega em si não só a destruição como a transformação em algo não muito aceitável. Também revela a ambigüidade, ou seja, guarda a esperança ou o desejo de retorno: “Voltar. Voltar, / Um dia”, afirmado em Fogo - Fátuo. Mas é no tempo-rio do sonho, que flui inexoravelmente, reservando possibilidades futuras, que o poeta também se realiza, como se confirma em Matéria: “Tempo que ainda / Há de ser rio / Como tudo há de ser / Ponte entre nós”.

A sensualidade se salienta no discurso lírico, confirmando o movimento, a leveza, a dinâmica temporal, estimulando sensações perdidas ou reencontradas, como se observa nos versos: “Quero englobar-te ao meu coração / Com um prazer de ovelha despostada / No coito dos pactos” (G’lobo Mau). Ou ainda: “Ah quero brincar no teu corpo / Corrermos juntos no brejo / Na indomável vastidão” (Jardim das Delícias).

O poeta busca o prazer da liberdade, da emoção pura e natural, revelando uma forte consciência urbana que, pela imposição do progresso, modifica o homem e a paisagem e faz aflorar os desejos mais recônditos, através da perda das convenções sociais, como se expressa em Um Poema Raso para uma Mocinha Linda lá do Condado Sertão da Paraíba: “De todos os lados da coisa / Brota um desejo louco / De andar descalço / De comer as frutas / Bodocar as casas”.

Mas o que representa a poesia para Elder Oliveira? Solidária e participativa, este é o seu destino traçado: “Viaja palavrinha / Pelos ares, avenidas / Saqueando as mágoas / Que estão contidas” (Poesia).

Homem de interior, o poeta se universaliza, ultrapassando o regional, para revelar sua natureza essencial na proposta a que se impõe, como “palhaço vadio”, no grande circo da vida, porém consciente de sua meta, implícita no Jardim das Delícias: “Quero sair na manhã / Sangrar o som desse / Instrumento que levo / No canto, essa força / De sonho que insiste / Em pulsar”.

Creio que restam muitas portas por abrir e muita surpresa a se descobrir, ainda, nessa obra e no percurso a ser trilhado por Elder Oliveira.

Zélia Nunes Saldanha

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